Breve Resumo
O vídeo aborda a judicialização da saúde no Brasil, um tema de extrema relevância devido ao grande volume de processos judiciais relacionados à saúde. O Dr. Clênio explora os fatores que contribuem para esse fenômeno, como a inflação na saúde, o envelhecimento da população e as novas tecnologias. Ele discute a evolução da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema, desde uma abordagem mais sentimental até a adoção de critérios técnicos e científicos. Além disso, são apresentadas as súmulas vinculantes 60 e 61 do STF, que estabelecem diretrizes objetivas para a judicialização da saúde pública, e a decisão do STF na ADI 7265, que define parâmetros para a judicialização da saúde suplementar.
- Inflação na saúde e envelhecimento da população são fatores que contribuem para a judicialização.
- O STF evoluiu de uma jurisprudência sentimental para uma abordagem técnica na judicialização da saúde.
- Súmulas vinculantes 60 e 61 e a ADI 7265 estabelecem diretrizes objetivas para a judicialização da saúde pública e suplementar.
Apresentação e Introdução ao Tema
A professora Ana Paula Sales apresenta o Dr. Clênio, que irá abordar um tema importante para a sociedade brasileira: o direito à saúde e a judicialização. Dr. Clênio expressa sua honra em participar da semana acadêmica e destaca a relevância do tema para a sociedade, especialmente no contexto da judicialização e da aplicação do direito nos tribunais. Ele menciona que disponibilizará um Qcode com um blog onde escreve sobre o direito da saúde e a judicialização, convidando a audiência a enviar sugestões e críticas.
O Cenário da Judicialização da Saúde no Brasil
O Dr. Clênio apresenta dados do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (FONAJUS) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que completou 15 anos. O FONAJUS tem como objetivo organizar e estabelecer diretrizes para a magistratura brasileira no tema da judicialização da saúde. Atualmente, existem aproximadamente 800 mil processos judiciais sobre saúde pendentes de julgamento no poder judiciário brasileiro, representando cerca de 1% do total de processos em tramitação. Desses, aproximadamente 450 mil envolvem o SUS (saúde pública) e 370 mil envolvem planos de saúde (saúde suplementar). O Dr. Clênio ressalta a importância de debater o tema da judicialização da saúde no ambiente acadêmico, devido ao grande volume de processos e à necessidade de analisar esse fenômeno.
Fundamentos da Judicialização da Saúde
O Dr. Clênio apresenta alguns fundamentos que justificam o grande número de processos judiciais na área da saúde. Um dos principais fatores é a inflação na saúde, que historicamente aumenta em proporção maior do que em outros setores. Isso dificulta o acesso das pessoas a tratamentos e medicamentos, que podem custar milhões de reais. Outro fator é o envelhecimento da população, que aumenta a necessidade de utilização do sistema de saúde. Além disso, a pesquisa e descoberta de novas doenças, como as doenças raras, e as novas tecnologias, como terapias gênicas e robótica, também contribuem para o aumento da demanda por tratamentos e, consequentemente, para a judicialização da saúde. O efeito da pandemia de COVID-19 também teve um impacto significativo na área da saúde.
Marco Teórico e a Perspectiva Inicial
O artigo 196 da Constituição Federal é o principal dispositivo jurídico constitucional que disciplina a saúde no Brasil. O Dr. Clênio cita Norberto Bobbio e sua obra "A Era dos Direitos", que revolucionou a compreensão sobre como cuidar das pessoas. Ele também menciona Alfonso Teloto e sua obra "A Era dos Não Direitos", que demonstra a dificuldade em concretizar os direitos fundamentais. O Dr. Clênio destaca a importância da obra de Antoan Garapon, "O Guardador das Promessas", que influenciou o poder judiciário brasileiro a auxiliar na concretização dos direitos fundamentais, em especial o direito à saúde. Ele também cita o livro do ministro Roberto Barroso, "A Judicialização da Vida e o Papel do Supremo", e a obra de Gabriele Palharítio, "Morrer sem Saúde", que aborda o alto custo das terapias e medicamentos. O Dr. Clênio explica que o poder judiciário se tornou um "player" importante para a concretização do direito à saúde, sendo considerado o poder do século XXI.
Como os Juízes Decidem as Demandas de Saúde
Historicamente, o judiciário utilizava dois critérios principais para julgar processos de judicialização da saúde: o critério sentimental e o critério técnico. O critério sentimental se baseava na difícil situação clínica do paciente e na crença de que uma liminar poderia salvá-lo, concedendo a liminar independentemente da eficácia do tratamento. O critério técnico considerava as evidências científicas e o custo do medicamento, buscando garantir que o tratamento fosse entregue a todas as pessoas com a mesma patologia. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) oscilou entre essas duas perspectivas. Em 2011, o STF autorizou pessoas a se tratarem em Cuba às custas do Estado, com base no "fundamento da esperança". No entanto, em 2016, o STF mudou seu entendimento, adotando uma jurisprudência técnica no caso da "pílula do câncer" (fosfoetalonamina), que não tinha eficácia comprovada.
A Jurisprudência Técnica e as Súmulas Vinculantes
O Supremo Tribunal Federal (STF) passou a adotar uma jurisprudência técnica, baseada em critérios de eficácia, segurança e efetividade dos tratamentos. O Dr. Clênio cita o livro "Reserva de Ciência e o Direito da Saúde" de David Servetti, que defende que uma decisão judicial só é válida se tiver eficácia no mundo real. Durante a pandemia, o STF fixou teses que consideram erro grosseiro violar normas técnicas e critérios científicos. Em setembro de 2024, o STF julgou os temas 1234 e 6, que se converteram nas súmulas vinculantes 60 e 61. A súmula 60 estabeleceu que o critério para definir o juízo competente é o valor do tratamento anual: se for igual ou superior a 210 salários mínimos, a União deve figurar no polo passivo e o processo tramitará na Justiça Federal; caso contrário, tramitará na Justiça Estadual. A súmula 61 fixou os critérios processuais que devem ser comprovados na petição inicial e analisados pela magistratura, como a prescrição médica, a imprescindibilidade do medicamento e o alto nível de evidência científica.
Oportunidades para Acadêmicos de Direito e o Papel das Súmulas Vinculantes
O Dr. Clênio destaca que o grande número de processos judiciais na área da saúde representa um nicho de trabalho para acadêmicos de direito, seja como consultores de planos de saúde, entes públicos ou hospitais, ou tutelando os consumidores. Ele ressalta que as súmulas vinculantes permitem o ajuizamento imediato de uma reclamação ao STF caso a decisão judicial seja contrária ao seu conteúdo, funcionando como uma espécie de "VAR" para corrigir decisões em tempo real. O Dr. Clênio apresenta um artigo que publicou em um blog, comparando a jurisprudência antes e depois das súmulas vinculantes, mostrando que o judiciário passou de um papel ativista para um papel de fiscalização, utilizando critérios objetivos e analisando o macroprocesso em vez de apenas o caso individual.
Novos Parâmetros de Julgamento e a Saúde Suplementar
Em 18 de setembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu novos parâmetros de julgamento para ações envolvendo planos de saúde, seguindo os mesmos critérios estabelecidos para a saúde pública. O Dr. Clênio destaca a importância de analisar o ato administrativo de não incorporação pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o caso concreto e a legislação, criando um "tripé" para a judicialização da saúde suplementar. Ele compara o modelo anterior, que analisava apenas o caso individual, com o novo paradigma, que exige a análise da legislação vigente e da decisão da ANS. O Dr. Clênio menciona a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7265, que estabeleceu essas diretrizes.
O Entendimento Atual do Supremo Tribunal Federal
O Dr. Clênio apresenta decisões do ministro Dias Toffoli e do ministro Luís Roberto Barroso, que indicam que não é possível fornecer tudo para todos e que o poder judiciário deve ser autocontido e atento às análises dos órgãos técnicos, como a CONITEC. Ele destaca que o Supremo Tribunal Federal (STF) não pode mais ser tão ativista na judicialização da saúde e precisa respeitar os órgãos da administração pública. O Dr. Clênio conclui que há uma transição efetiva de uma posição sentimental para um entendimento mais técnico, em que o julgador deve verificar se o tratamento é eficaz e se trará resultados positivos antes de proferir a decisão.
Recomendações de Livros e Reflexão Final
O Dr. Clênio recomenda o livro "Custo dos Direitos" de Stephen Holmes e Cass Sunstein, que aborda a teoria dos direitos fundamentais e a concretização do direito à saúde. Ele também indica os livros "O Doente Imaginado" e "Medicina Demais" de Marco Bobbio, que tratam da ciência médica e dos limites da judicialização da saúde. O Dr. Clênio conclui com a reflexão de que o direito da saúde existe para proteger adequadamente as pessoas dentro das possibilidades existentes, e que o papel de todos é interpretar o direito da saúde da melhor forma possível, utilizando a judicialização, a mediação e a conciliação para estabelecer os limites desse direito.
Sessão de Perguntas e Respostas
Durante a sessão de perguntas e respostas, o Dr. Clênio aborda questões como a coexistência do direito à saúde com o princípio da dignidade humana, o impacto do excesso de demandas judiciais no planejamento das políticas públicas de saúde, a atuação conjunta entre profissionais do direito e da saúde, e a preparação da formação jurídica tradicional para equilibrar decisões técnicas e sentimentais em casos de saúde. Ele destaca a importância da dimensão social da dignidade humana, da sinergia entre o sistema de justiça e os profissionais de saúde, e da necessidade de a formação jurídica tradicional se adaptar à dinâmica da sociedade e às novas tecnologias.

